Author(s): Cornelia Meyer
Traduzido por Filomena Freitas. O impacto de um enorme meteorito e depois uma viagem a bordo de uma rocha de Marte. Terá sido assim que começou a Vida na Terra? Cornelia Meyer leva-nos numa viagem espacial através da teoria da Litopanspermia e descreve como a está a testar com a ajuda de…
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Imagem de Marte cortesia da NASA;
Imagem da Terra cortesia de
Deutsches Zentrum für Luft-
und Raumfahrt
A 7 de Agosto de 1996, cientistas da NASA anunciaram que haviam identificado estruturas semelhantes a microscópicas bactérias fósseis no meteorito Marciano ALH84001, encontrado em Allan Hills, na Antártida. Apesar do mundo científico não estar de acordo em relação à importância do meteorito de Allan Hills, a questão mantém-se: terá existido Vida em Março?
Quando um cometa ou asteróide atinge um planeta, podem ser quebrados fragmentos rochosos que são catapultados para o Espaço – como o meteorito de Allan Hills – e, por vezes, aterrarem em outros planetas sob a forma de meteoritos (ver glossário). Isto tem causado muita especulação. Poderão as primeiras formas de Vida ter surgido não na Terra, mas em Marte, ou talvez num outro planeta distante? Nesse caso, poderiam os meteoritos ter transportado a Vida para a Terra?
Em 2007, três outros estudantes de Pós-Graduação – Ralf Moeller, Thomas Berger e Jean-Pierre de Vera – e eu decidimos investigar esta ideia, conhecido como a teoria da Litopanspermia (ver imagem acima), em três etapas:
- A ejecção de organismos vivos para o Espaço.
- O efeito da viagem no Espaço sobre os organismos vivos.
- A sua sobrevivência ao entrar na atmosfera da Terra e aterrar.
1. A viagem começa
Painéis representando experiências
na ISS, semelhantes ao meteorito
artificial planeado
Imagem cortesia de Cornelia Meyer
Como parte das nossas teses de Mestrado e Doutoramento, investigámos a primeira etapa: a fase de ejecção, na qual o material vivo é lançado no Espaço pelo impacto de um meteorito (Horneck et al, 2008; Stöffler et al, 2007). Para simular o acontecimento, utilizámos duas placas de rocha semelhantes às rochas que se pensa existir em Marte, colámos uma camada de microrganismos entre elas, colámos esta ‘sandwich’ num cilindro de ferro e rebentámo-la com TNT.
Tínhamos boas razões para usar microrganismos nesta experiência. Na Terra, os micróbios seriam os organismos mais prováveis de suportar a experiência, já que são conhecidos por sobreviverem em ambientes extremamente hostis. Por outro lado, sendo organismos simples, talvez fossem semelhantes às formas de Vida primitiva em Marte. Os microrganismos escolhidos para a experiência foram esporos de bactérias, cianobactérias e líquenes que vivem dentro ou na superfície das rochas, e que são capazes de sobreviver às condições simuladas do Espaço.
A escolha das rochas também foi cuidadosa. Para verificar se um meteorito é originário de Marte, a sua composição é comparada com rochas estudadas da superfície de Marte. Os meteoritos marcianos encontrados na Terra mais frequentemente são conhecidos como Shergotites basálticas e foram formadas por actividade vulcânica. Por essa razão, nas nossas experiências usámos basalto: uma rocha facilmente encontrada na Terra e semelhante às rochas marcianas.
Em várias experiências, nas explosões de TNT, os microrganismos foram expostos a pressões entre 50 000 e 500 000 bar. Estes valores são semelhantes às pressões causadas pelo impacto de um meteorito em Marte, que originariam crateras com mais de 75 km de diâmetro e seriam capazes de lançar rochas marcianas para o Espaço. A compressão da explosão também sujeitou os microrganismos a temperaturas até 1000ºC. Apesar de se esperar que estas condições destruíssem toda a Vida, a 400 000 bar (400 000 vezes a pressão atmosférica normal), 0.02% dos microrganismos sobreviveram.
Actualmente, a temperatura em Marte varia entre -143ºC, nos Pólos, e +27ºC, no Equador. Apesar de antigamente Marte ter sido mais quente, deve ter arrefecido mais rapidamente do que a Terra por ter perdido a sua atmosfera. Isto significa que, na altura da suposta transferência de Vida de Marte para a Terra (há cerca de 20 milhões de anos), Marte já deveria ter atingido as baixas temperaturas que lá existem actualmente. Por esta razão, numa segunda experiência, de modo a melhor reproduzir as condições em Marte, usámos gelo seco (dióxido de carbono sólido) para arrefecer o sistema a -80ºC antes de o sujeitar à explosão, e descobrimos que alguns microrganismos sobreviveram, mesmo a 500 000 bar. Na experiência anterior, não arrefecida, nenhum microrganismo havia sobrevivido a essa pressão.
Durante as experiências, os microrganismos foram expostos a temperaturas e pressões elevadas durante apenas uns segundos, tal como teria acontecido durante o impacto real de um meteorito em Marte. Esta pode ter sido a chave para a sua sobrevivência. Então, a primeira parte da Teoria da Litopanspermia parece ser plausível: organismos em rochas podiam sobreviver a um lançamento no Espaço.
2. Viagem no Espaço: o concurso SUCCESS da ESA para estudantes
O impacto de um meteorito na Terra
Imagem cortesia de iStockphoto
Em seguida, decidimos competir pela oportunidade de investigar a segunda etapa da Teoria da Litospanspermia: poderiam organismos vivos sobreviver às condições de frio extremo, radiação cósmica e vácuo de uma longa viagem espacial? No concursow1, SUCCESS para estudantes, organizado pela Agência Espacial Europeia (ESA), foi-nos dada a oportunidade de realizar uma experiência a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS), em Novembro de 2009.
Desde os anos 80, várias experiências demonstraram que os microrganismos são capazes de sobreviver no Espaço (e.g. Mileikowsky et al, 2000). No entanto, nesses testes, os microrganismos estavam protegidos da radiação por alumínio, ou então passaram apenas poucos dias no Espaço. Então, quanto tempo poderiam eles sobreviver no Espaço? Nós pretendemos usar a ISS para realizar uma investigação mais realista do efeito das condições espaciais em organismos vivos.
Sugerimos a construção de um meteorito artificial, empacotado com microrganismos, assim como com sensores para medir os raios cósmicos e a temperatura. Um pedaço de rocha basáltica será cortado em oito fatias, com buracos para colocar os microrganismos e os sensores. Os buracos serão selados com rocha e as fatias colocadas na sua posição original. O meteorito artificial será então transportado para a ISS, montado numa plataforma de alumínio no exterior da Estação e exposta às condições do Espaço durante seis meses. Como controlo, um segundo meteorito artificial ficará na Terra.
Assim que o meteorito regresse à Terra, os biólogos Ralf e Jean-Pierre irão determinar a taxa de sobrevivência dos microrganismos e verificar se eles sofreram alterações fisiológicas induzidas pelas condições no espaço. Como mineralogista da equipa, eu irei investigar a meteorização espacial do meteorito artificial. Meteorização espacial é um termo que engloba todos os processos que actuam sobre os corpos no ambiente espacial agreste, tais como, radiação cósmica, ventos solares e bombardeamento por meteoritos. Iremos comparar as propriedades físicas do meteorito artificial com as rochas que ficaram na Terra.
Para além de fornecer provas que possam apoiar a Teoria da Litopanspermia, estes resultados podem fornecer informação sobre o efeito da meteorização do espaço sobre as propriedades ópticas das rochas. Estas propriedades são importantes para a observação de asteróides, já que a espectroscopia óptica é usada para determinar a sua composição elementar. Um maior conhecimento da meteorização espacial, poderá, deste modo, ajudar os cientistas a determinar se os meteoritos encontrados na Terra e os asteróides no Espaço provêm de um mesmo corpo original.
3. Uma nova experiência? Uma aterragem suave
Mesmo que as primeiras duas partes da Teoria da Litopanspermia sejam plausíveis – os microrganismos podem sobreviver a uma viagem prolongada no Espaço após terem sido arrancados do seu planeta – será que conseguem sobreviver noutro planeta? Os Astrobiólogos do Deutsches Zentrum für Luft- und Raumfahrt são da opinião que os microrganismos terrestres são capazes de sobreviver durante algum tempo em Martew2. Isto sugere que as formas de vida Marcianas também poderiam sobreviver na Terra, assumindo que suportavam o impacto. Actualmente, possuímos um conhecimento reduzido sobre o que sucederia se um meteorito transportando organismos vivos aterrasse na Terra. No entanto, possuímos informação que nos permite especular.
Ao entrarem na atmosfera da Terra a elevada velocidade, a superfície dos objectos é exposta a temperaturas muito elevadas, devido à fricção. No entanto, apesar das temperaturas nas camadas exteriores do meteorito serem suficientemente elevadas para derreter – ou até mesmo, vaporizar – a rocha, o interior do meteorito mantém-se com temperaturas próximas dos -273ºC (0 K) verificadas no Espaço.
Muito frequentemente, os meteoritos são quebrados quando atingem o solo. Se os microrganismos tivessem sobrevivido no interior do meteorito – protegidos das temperaturas muito elevadas à superfície deste – eles seriam, então, libertados e poderiam colonizar a Terra. Eles experimentariam um choque térmico, ao passarem de -273ºC no interior do meteorito para a temperatura ambiente da Terra, mas os microrganismos são conhecidos pela sua capacidade para sobreviver a alterações bruscas de temperatura.
As provas da Litopanspermia?
Mesmo que os microrganismos tenham conseguido sobreviver às três etapas descritas na Teoria da Litopanspermia, isso não comprovaria que a vida na Terra tenha tido origem extraterrestre. Acima de tudo, não sabemos realmente se existe vida fora do nosso planeta – mas a procura de vida extraterrestre continua, também.
References
- Horneck G et al (2008) Microbial rock inhabitants survive impact and ejection from host planet: first phase of lithopanspermia experimentally tested. Astrobiology 8: 17-44
- Mileikowsky C et al (2000) Natural transfer of viable microbes in space. Part 1: From Mars to Earth and Earth to Mars. Icarus 145: 391-427
- Stöffler D et al (2007) Experimental evidence for the potential impact ejection of viable micro-organisms from Mars and Mars-like planets. Icarus 186: 585-588
Web References
Resources
Institutions
Author(s)
Quando o grupo iniciou as suas experiências, Cornelia Meyers era aluna de Mestrado em Mineralogia, no Museu de História Naturalw3em Berlim, Alemanha. Ralf Moeller (Deutsches Zentrum für Luft- und Raumfahrt, DLR – o Centro Aeroespacial Alemão) e Jean-Pierre de Vera (Universidade de Düsseldorf, Alemanha) eram alunos de Doutoramento em Biologia. Thomas Berger era aluno de Doutoramento em Física na DLR. Cornelia é agora aluna de Doutoramento, enquanto os restantes estão a realizar investigação Pos-Doutoral.
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