Panificação: ensino de ciências na escola primária Teach article

Traduzido por António Daniel Barbosa. Mesmo o pão do dia-a-dia pode oferecer um surpreendente espectro de oportunidades interdisciplinares de ensino.

Imagem cortesia
demadlyinlovewithlife; Fonte
da Imagem: Flickr

Há milénios o ser humano misturou farinha e água para fazer pão. A certo ponto, um padeiro distraído, possivelmente pela passagem de um tigre dentes de sabre, regressando à massa horas mais tarde encontrou-a estranhamente mais leve e macia. Desta forma foram lançadas as fundações do pão levedadow1 – pão crescido usando leveduras, um microrganismo comum no meio ambiente.

Nesta série de atividades para crianças de idades entre os 9 e os 11 anos, inspecionamos a ciência da panificação e os microrganismos úteis envolvidos. As atividades 1 a 4 podem ser executadas numa hora mas a produção do pão necessita de pelo menos meio-dia, realizada simultaneamente com as atividades enquanto o pão leveda.

Atividade 1: observar micróbios naturais

Morangos bolorentos
Imagem cortesia deseniwati;
Fonte da Imagem: Flick

Existem diversos microrganismos no mundo à nossa volta, invisíveis a olho nu. Tal como nós, estão programados para sobreviver e reproduzirem-se; para o fazer precisam de se alimentar de açúcares naturais e proteínas onde quer que os encontrem e, no processo, causam a sua decomposição. Já alguma vez pegou numa laranja e encontrou um anel de bolor branco com bolor verde-azulado no centro, ou tirou queijo do frigorífico e descobriu que um bolor preto-esverdeado chegou lá primeiro?

É fácil ir à “pesca de micróbios” quase em qualquer local e pode levar a sua turma numa “pescaria” fazendo com que eles deixem pratos com pão, queijo ou fruta expostos ao ar, num local seguro, e esperando alguns dias ou semanas. O que os alunos irão observar é o resultado da deposição na comida dos micróbios do ar e da sua alimentação dos açúcares e proteínas neles contidos, eventualmente formando corpos frutíferos a que chamamos bolor.

 

Nota de segurança

Assegure-se que nenhuma das crianças é alérgica ao bolor e lembre-lhes para não comer os alimentos ou de se chegarem demasiado perto dos bolores para não respirarem os esporos.


 

Um pedaço de leveduras
vivas

Imagem cortesia deHellahulla;
Fonte da Imagem: Wikimedia
Commons

Um exemplo mais rápido dos micróbios a alimentarem-se pode ser observado usando fermento de padeiro – um conjunto de leveduras que pode ser observado, cheirado e sentido. Peça à turma para misturar uma colher de chá de fermento de padeiro fresco ou seco com cerca de 100 ml de água aquecida e açúcar e deixe a mistura num local aquecido e ventilado. Após algum tempo, as crianças devem ser capazes de observar a formação de espuma na mistura e de detetar um cheiro acre. Estes efeitos são causados pela produção de dióxido de carbono e álcool num processo designado por fermentação.

Muitas crianças saberão que as leveduras são usadas para fazer pão, mas como está a fermentação envolvida?

Corte uma fatia de pão e peça às crianças para descreverem o que observam. Espera-se que eles digam que vêm bolhas e que o pão parece-se com uma esponja. Pergunte-lhes se conseguem estabelecer uma ligação entre as bolhas que observaram nas leveduras em fermentação e as que se encontram no pão.

Colónias de leveduras a
crescer em agar

Imagem cortesia deLilly_M;
Fonte da Imagem: Wikimedia
Commons

Faça às crianças mais algumas perguntas:

  • O que acontece às bolhas nas leveduras em fermentação? (eventualmente rebentam)
  • Por que tal não acontece às bolhas no pão? (Porque estão no “interior” do pão)
  • O que acontece no pão para que as bolhas se mantenham no seu interior? (Farinha misturada com água)

Agora uma pequena atividade. Peça às crianças para imaginarem que são leveduras, soprando dióxido de carbono para o ar. Para onde vai o ar? De seguida, dê-lhes balões e peça-lhes para soprarem para dentro deles. Qual é a diferença em relação ao destino do ar? (É mantido no interior dos balões). Ajude as crianças a perceber a diferença colocando todos os balões insuflados numa caixa para simular o dióxido de carbono num pão, mantido no lugar por pequenos “balões” de massa.

Atividade 2: a história da panificação

Imagem cortesia dedjwtwo;
Fonte da Imagem: Flickr

Na atividade 1, as crianças terão aprendido que as leveduras, açúcar e água produzem o gás preso que faz o pão aumentar de tamanho. Também terão aprendido que a farinha, quando misturada com leveduras e água, forma um “balão” que aprisiona as bolhas de gás no pão. Como uma introdução aos aspetos mais amplos da panificação, pode ler a história A pequena galinha vermelha. Se não tiver uma cópia, use a versão online do Projeto Gutenbergw2. A história ilustra claramente os principais aspetos da panificação desde o campo até ao prato.

Após ler a história, peça à turma para ilustrar e legendar cada passo do processo e exiba-os ao longo da sala de aula. Podem os alunos usar as ideias do livro juntamente com o que aprenderam na atividade 1 para escrever instruções para fazer pão? Podem existir lacunas mas eles podem preenche-las mais tarde após completarem as restantes atividades.

Vikings a navegar no seu
Dracar

Imagem cortesia
deduncan1890 / iStockphoto

Atividade 3: invasores e colonizadores

Tal como muitas outras regiões, as ilhas Britânicas têm uma longa História de invasões e colonizações: os Romanos, os Anglos, os Saxões, os Jutos e Vikings, todos viajaram até às ilhas Britânicas como invasores e acabaram por se instalarem. Da mesma forma, a Europa continental assistiu a uma onda de invasores e colonizadores ao longo dos séculos. Os recém-chegados trouxeram alguma comida consigo mas a certo ponto necessitaram de comer alimentos locais. Pode integrar o tema da panificação e consumo de pão em aulas de história usando o tema dos invasores e colonos. Vamos começar com uma dramatização.

Num local da entrada ou do recreio, marque cones ou cadeiras com sinais listando tipos de comida como bagas, frutas, trigo, carne, lacticínios e vegetais. Peça às crianças para se sentarem nesse local como se fossem colonos, olhar para os alimentos listados à sua volta e decidir quais provavelmente comeriam enquanto colonos. Pode ser necessário lembrar-lhes das épocas do ano nas quais os diferentes alimentos estão disponíveis e também o tempo necessário para cultivá-los ou transformá-los em alimentos comestíveis.

De seguida repita a dramatização pedindo aos alunos para entrar neste local em diferentes épocas do ano como invasores que não ficarão no local por muito tempo. Quais os alimentos que comeriam e quais estariam indisponíveis? Podem eles sugerir a razão dessa escolha? O que fariam os invasores se decidissem instalar-se no local?

Pedaço de pão com bolhas
de ar grandes

Imagem cortesia defoonus;
Fonte da Imagem: Flickr

A atividade deve ensinar às crianças que géneros alimentícios como o pão ou vegetais têm de ser cultivados e processados usando ferramentas, sendo apropriados para colonos, enquanto outros como a carne ou as bagas podem ser imediatamente utilizados e processados facilmente, sendo portanto alimentos adequados para invasores.

Atividade 4: diferentes tipos de pão

Para esta atividade peça às crianças para trazerem diferentes tipos de pão. Entre outros, pode obter pão integral, celeiro (com farelo acrescentado e germe de trigo), aveia, centeio, pão irlandês e pães simples. Organize um teste de observação e prova. Peça às crianças para sugerir características para comparar, tais como o aspeto do pão, a sua textura, o tamanho dos seus buracos/bolhas, o seu sabor e se gostam ou não desse pão.

 

Nota de segurança

Antes de começar assegure-se que nenhuma das crianças sofre de doença celíaca, uma doença autoimune espoletada pela proteína glúten do trigo.


 

Se o pão for pré-embalado, pode consultar as informações no saco sobre os seus ingredientes e como foi cozido. Caso contrário, pode encontrar informação nutricional sobre diferentes tipos de pão na internetw3. Se já abordou o tópico da alimentação saudável, as crianças irão perceber as bases da informação nutricional apresentada no saco. Se ainda não abordaram este assunto, uma rápida investigação online das categorias contidas na informação nutricional irá dizer-lhes o que é e o que não é saudávelw4. Pode então debater o que é saudável analisando a informação nutricional em cada saco e fazendo uma classificação dos pães baseando-se no facto de ser ou não saudável, decidindo o que existe em cada pão que o torna, ou não, saudável. Qual possui a maior quantidade de fibra, por exemplo, ou a menor quantidade de sal?

Atividade 5: fazendo o seu próprio pão

Massa de uma baguete após
levedar. As bolhas de ar são
formadas a partir do dióxido
de carbono produzido pelas
leveduras durante a
fermentação

Imagem cortesia deDawn
Endico; Fonte da Imagem:
Flickr

Agora para fazer o pão! As crianças adoram esta atividade, que é fácil e quase sempre bem-sucedida. Vá aos aspetos básicos e arranje alguns grãos de trigo para eles “moerem” usando um almofariz e um pilão. As crianças irão ver a farinha a surgir a partir dos gãos esmagados e pode peneirar para obter farinha pura. Não recomendaria fazerem toda a farinha desta forma pois tal iria demorar uma eternidade. Alternativamente, misture a farinha resultante com farinha comercial de panificação para obter a quantidade necessária. Como uma atividade simultânea, pode mostrar alguns grãos de trigo e vê-los crescer – talvez produzir trigo para a turma do ano seguinte. Esta atividade irá fazer a ligação perfeita com a história d’A pequena galinha vermelha.

Kneading the dough
Imagem cortesia deAnonymous
friend of ElinorD; Fonte da
Imagem: Wikimedia Commons

Lembra-se daqueles micóbios úteis na primeira atividade? Comece com um pouco da mistura de levedura que as crianças fizeram na atividade 1. Logo que faça espuma, misture com a farinha e sal e agite vigorosamente – pode descarregar a receita a partir da página da internet da Science in Schoolw5. Vai necessitar de adicionar mais água morna até que a massa se transforme numa bola que deixe os lados da tijela limpa, altura em que as crianças devem começar a amassa-la numa área de trabalho limpa e enfarinhada. O que eles veem acontecer à massa à medida que a amassam? O glúten contido na farinha vai sendo libertado, tornado a massa elástica. Quando a massa ficar macia, vai ter de a colocar num local quente para que levede (“amadureça”).

Uma hora mais tarde pergunte às crianças o que elas observam e o que pensam que terá acontecido à massa para a fazer crescer. Cuidadosamente, corte um pedaço usando uma faca afiada e mostre às crianças as bolhas na massa. Lembre-lhes da experiência do balão para reforçar a razão do ar se manter na massa. A massa do pão necessita de ser amassada uma segunda vez antes de ser deixada a levedar novamente; isto ajuda a espalhar as leveduras e o ar em toda a massa. Finalmente estará pronto para ser cozido. Faça um pão você mesmo que pode usar como exemplo, cortando-o uma vez cozido para cheirar as leveduras e ver as bolhas.

Acknowledgement

This activity was first published on Freedom to Teach, the Collins Education blogw6


Web References

Resources

Author(s)

Com formação em ensino com especialização em ciência, David Lewis tem exercido a profissão de professor de escola primária durante 20 anos no Reino Unido e ensina agora numa escola internacional em Chipre. Em 2006, David e os seus pupilos chegaram às finais do Rolls Royce Science Prize, atribuído a abordagens inovadoras à ciência nos currículos. Tem estado envolvido na formação de professores e desenvolvimento curricular e, no seu tempo livre, escreve para a revista Teach Primary, Collins Education e um blog de educação no Chipre.

Review

Este artigo propõe atividades inovadoras e interessantes vocacionadas para a escola primária, combinando química, história e culinária – ensinando sobre micróbios no contexto da produção de pão. Apesar do autor recomendar a atividade para alunos de 9 a 11 anos de idade, tenho a certeza que jovens alunos de escolaridades superiores adorariam fazer o jogo, experiências com leveduras e ir mais além e preparar o seu próprio pão.

Christiana Nicolaou, Cyprus

License

CC-BY-NC-SA